"Welcome to Fantasy Island"
Quando os aspirantes a pilotos acabam o brevet, diz-se que ganham as suas "asas". Ora bem, no fim-de-semana passado eu ganhei as minhas “barbatanas” e tornei-me num homem-rã diplomado.
Depois de uma gripe que durou quase 2 semanas, e que me entupiu da cabeça aos pés, ter impedido o teste final para me transformar num mamífero aquático, no fim-de-semana lá fui até à Malásia para completar a instrução. Como já tinha sido publicado anteriormente, a florzinha de estufa da minha mulher já tinha completamente renunciado às suas “barbatanas”, reafirmando a sua crença profunda na teoria da evolução – afinal de contas se tivéssemos sido feitos para passar mais do 20 minutos dentro de uma piscina, teríamos nascido com membranas entre os dedos e com guelras em vez de pulmões (acho que isto me faz lembrar o Homem da Atlândida). Sendo assim, fui apenas acompanhado de alguns dos meus colegas que, por solidariedade é claro, se voluntariaram para ficar doentes ao mesmo tempo do que eu. Isto aqui no INSEAD é assim, as salas de aulas, quais frigoríficos infernais, são um óptimo meio para culturas biológicas e virais.
zzzzeee plane, zzzzeee plaaaaanee...
Depois de umas 8 horas de viagem de autocarro e de barco (onde mais uma vez passei um frio de rachar graças aos omni-presentes aparelhos de ar-condicionado), lá chegámos às 4 da manhã ao “paraíso”. O sítio fez-me lembrar o “Fantasy Island” que dava na televisão quando era miúdo. Só que em vez do hidroavião semanal é um barco que leva toda a gente e em vez das pessoas irem lá para redescobrir a alegria da vida vão lá só para mergulhar. Pudera, também não há mais nada para fazer. O único senão é ter de dormir numas camaratas para uma dúzia de outros homens e mulheres-rã em cima de colchões que não conseguem disfarçar os enormes intervalos entre as travessas da cama.
É agora que eu dou uma amona no francês
No Sábado acordámos a morrer de sono mas logo os instrutores nos agarraram pelos cabelos e nos arrastaram para dentro do barco para iniciarmos os preparativos do primeiro mergulho. O programa parecia assustador: a 6 metros de profundidade, temos que tirar e por as máscaras, tirar e por o respirador, sobreviver com o respirador do vizinho e conseguir subir à superfície sem respirar. Tudo isto sem entrar em pânico nem fazer figuras tristes. Depois de algum nervosismo inicial lá me atirei para dentro de água. Posso garantir-vos (para os que nunca experimentaram) que saltar paro o oceano profundo com uma botija que pesa quase 20 Kg às costas e com um cinto de chumbo que pesa outros 8 Kg não é um bom começo. Achei que me ia afundar logo ali e que não iria sobreviver mais do que os primeiros 45 segundos (o tempo que consigo suster a respiração). O que vale é que, apesar do peso, tudo aquilo consegue flutuar e que, se tivermos dificuldades, podemos ainda insuflar o colete para flutuarmos melhor. Maravilhas da tecnologia.
Focas à deriva
No fim do primeiro mergulho já estava mais relaxado: “Prova Superada” sem pânicos nem figuras tristes e tudo à primeira. Nos mergulhos seguintes já foi tudo mais em ritmo de passeio com ainda algum “trabalho específico” nos meus dotes de batráquio-humano. Entre o Sábado e o Domingo lá completámos os 4 mergulhos da praxe, cheios de cenas dignas dum documentário do Jacques Costeau. Tartarugas, moreias, peixes-borboleta e corais de todas as formas e feitios deixavam de pertencer ao mundo da televisão e materializavam-se perante o nosso ar surpreso. O curioso é que, debaixo de água, a surpresa não se manifesta com olhares boquiabertos nem com Ahs de espanto mas antes através de um gesticular interminável. O falatório só começa quando submergimos. Mesmo antes de subir para o barco, a excitação é tal que parecemos mais um bando de focas cacofónicas do que uns meros humanos a lutarem pela sobrevivência num meio estranho.
Na viagem para casa só nos lembrávamos da frase lapidar do nosso Dean Helmut Schutte: “This is not Club Med”. Um dia havemos de lhe explicar que ele está certo: não é de facto o Club Med, é ainda melhor.
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