Thursday, February 24, 2005

Portugal visto com olhos em bico (a partir de Singapura)

Depois de mais de 6 meses de ausência, Portugal começa a parecer diferente. À medida que nos vamos alimentando com notícias esporádicas do site do Público, com umas revistas que de vez em quando nos passam pelas mãos e com umas opiniões soltas de quem por cá passa ou de quem telefona, a percepção que se tem do país natal vai-se tornando cada vez mais turva. Ou talvez não. Ora vejamos:

Política Nacional

A vida política nacional esteve durante algum tempo pejada de gabirus que usurparam o poder sem o voto popular e que, apesar do burburinho todo, não decidiram nada, não fizeram nada e só aborreceram o Zé Povinho. Este, totalmente revoltado, acabou por destronar o usurpador-mor e colocou no poder um demagogo de esquerda que promete um novo tempo de vacas gordas. O problema é que o novo demagogo tem a mania que é o Tony Blair mas tem a mesma capacidade intelectual do usurpador destronado. Não nos parece que a diferença vá ser grande em termos de resultados práticos. A única diferença é que o Zé Povinho vai durante algum tempo andar contente para logo depois cair na real e concluir que continua a viver numa República das Bananas – não vão faltar “jobs for the boys”, Casas Pias, imensuráveis deficits do orçamento de estado, criação de institutos fantasma e outras escandaleiras que infelizmente já não conseguem surpreender ninguém.

Segurança

Portugal tornou-se definitivamente num sítio muito perigoso: gangs fazem emboscadas a patrulhas de polícia (à filme americano – só falta usarem lança-rockets e Kalashnikovs), pessoas são assaltadas todos os dias em plena luz do dia e à vista de transeuntes indiferentes e famílias inteiras são massacradas por primos enfurecidos com quezílias da vida quotidiana. Decididamente, é melhor não passear por Lisboa se não se possuir uma BMW blindado ou se não se andar com um guarda-costas minimamente competente.

Desporto

Continua só a haver um desporto em Portugal – o futebol. Só que mesmo esse anda pelas ruas da amargura. O objectivo do jogo passou a ser dar pontapés nas canelas do adversário em vez de marcar golos, os jogos acabam todos empatados, no fim há insultos em barda, os árbitros são todos corruptos empedernidos e ser treinador passou a ser uma profissão de risco. Depois admiram-se que nenhuma equipa consiga fazer boa figura nas competições europeias e que o Braga tenha comandado isolado o Campeonato Nacional já depois do Natal. Enfim, ainda mais pobre do que é costume.

Sociedade

Passou a haver apenas duas categorias de colunáveis em Portugal – o José Castelo Branco (claramente, este está numa categoria à parte) e todos os actores, cantores e empresários de segunda categoria que aparecem em todas as ocasiões que podem mas que ninguém sabe quem é que eles são. Pelo menos, nós aqui não sabemos. Um ponto em comum, todos têm muito mais tempo de antena do que alguma vez mereceram. O JCB passou de ave-rara a contrabandista para agora ser elevado ao estatuto de superstar só porque andou a pavonear-se pela televisão 24 horas por dia com calças Gaultier, carteira Chanel e outras mariquices. Os de segunda categoria aparecem e desaparecem à velocidade da luz, ninguém se sabe o que eles faziam antes mas ninguém se preocupa porque, passadas duas semanas, também ninguém se vai lembrar quem eles eram. Enfim, uma verdadeira farsa. A verdade é que em Singapura, a vida social também é uma anedota, mas pelo menos ninguém anda a fingir que é uma coisa muito séria e importante.

Negócios e Economia

Em Portugal ninguém faz rigorosamente nada. Para quê preocupações com empresas que produzem realmente alguma coisa quando se pode montar um restaurante ou uma loja de artigos importados e fazer um bom dinheiro na mesma. Mais de resto, quem quiser ficar realmente rico, basta comprar ou vender empresas que não produzem nada (de preferência bancos ou empresa de telecomunicações) e mudar-se de Lisboa para a Quinta do Lago. Continua-se a tirar férias na mesma só que num sítio diferente.

Depois de viver num país que cresce 8% ao ano (nos anos maus), que não tem desemprego e que tem um PIB per capita equivalente ao da Suécia, não há visão mais terceiro-mundista do que uma economia em queda livre e um desemprego galopante. Aliás, à distância, a nossa impressão é que o Rossio está cheio de desempregados a pedir dinheiro no passeio e as filas nos Centros de Emprego dão voltas ao quarteirão.

Cultura

A mesma coisa que havia antes só que agora nem há dinheiro para as temporadas no São Carlos. A única cultura que ainda existe é aquela que as televisões passam no prime-time: telenovelas, reality shows manhosos e humor de um nível muito baixo. Não é grande coisa mas pelo menos é de graça. Não é verdadeiramente Cultura mas também ninguém se importa porque nunca viram da verdadeira.

3 Comments:

Blogger Teresa said...

Ui. Cheira-me que vou ficar retida em Singapura.

4:46 PM  
Anonymous Anonymous said...

Estou a ver q estão mt bem informados do q se passa por aqui..... se calhar vou aí ter com vocês e já não volto! Bjs

7:03 PM  
Anonymous Anonymous said...

Ataque de snobeira?
Ou a mais pura realidade?
Voto nesta última, embora me custe!

Marta

5:39 PM  

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